Por que os seguros residenciais contra desastres climáticos são raros no Brasil?

Por que os seguros residenciais contra desastres climáticos são raros no Brasil?

Seguros residenciais são uma proteção essencial, mas no Brasil, sua adesão é surpreendentemente baixa. Vamos explorar os motivos por trás dessa realidade e o que pode ser feito para mudar isso.

A Realidade dos Seguros Residenciais no Brasil: Por Que Tão Poucos Estão Protegidos?

E aí, pessoal! Vocês já pararam pra pensar em como estamos vulneráveis aos desastres naturais? No Brasil, a situação é um tanto preocupante: apenas 17% das residências brasileiras contam com algum tipo de seguro. E o que é ainda mais alarmante, menos de 1% dessas apólices oferece cobertura contra alagamentos. Isso é um contraste e tanto, especialmente quando vemos a frequência de eventos climáticos extremos aumentar, como o temporal que castigou o Paraná em 4 de novembro de 2025, com granizo de até 100 gramas e ventos acima de 90 km/h, deixando mais de 100 mil casas sem luz e 4.056 imóveis danificados em 15 municípios, desalojando mais de 400 pessoas até 3 de novembro.

O Cenário dos Desastres Climáticos no Brasil: Números Que Preocupam

A gente sabe que o clima está mudando, e os números não mentem. O Brasil tem visto um salto assustador nos desastres relacionados a chuvas. Pensem comigo: na década de 1990 inteira, registramos 2.335 ocorrências. Mas, entre 2020 e 2023, esse número explodiu para 7.539, um aumento de 223%! A média anual de desastres nesse período foi o dobro da década anterior (2010-2019) e impressionantes 7,3 vezes maior que nos anos 90. Esses dados vêm de um estudo publicado em julho pela Aliança Brasileira pela Cultura Oceânica, coordenada pela Unifesp.

E não somos os únicos a sentir o impacto. A América Latina, por exemplo, tem uma “brecha de proteção” de 81% — ou seja, a maior parte das perdas por desastres climáticos não é coberta por seguros, segundo a seguradora Mapfre. Só a Ásia está pior, com 83%. Enquanto isso, na América do Norte, onde a cultura de seguros é mais forte, essa lacuna é de 43%.

Conheça os Tipos de Seguros Que Podem Proteger Sua Casa

Quando falamos em proteger o lar, existem basicamente três tipos de seguros que podem entrar em jogo:

  • Seguro Residencial: Esse é o mais conhecido e opcional. Ele protege tanto a estrutura da sua casa quanto os bens que estão dentro dela. A cobertura básica geralmente inclui incêndio, queda de raio e explosões. Mas o legal é que você pode adicionar coberturas extras para eventos como vendavais, furacões, ciclones, tornados, granizo e, sim, até alagamentos. É você quem decide o que e quanto quer segurar.
  • Seguro Habitacional: Se você financiou seu imóvel, especialmente pela Caixa, esse seguro é obrigatório. Ele foca na estrutura da residência, cobrindo danos por incêndio, raio, explosão, desmoronamento, vendaval, inundação ou alagamento. Ele também serve para proteger o banco caso você não consiga pagar o financiamento por causa de um desastre.
  • Seguro Condomínio: Obrigatório ao menos para o risco de incêndio, cobre danos à estrutura de um edifício com múltiplas unidades habitacionais.

Por Que o Brasileiro Ainda Não Abraça o Seguro Residencial?

Essa é a pergunta de um milhão de reais, né? Por que, com tantos riscos, a adesão ainda é tão baixa? Vários fatores contribuem para isso:

1. Menor Vulnerabilidade Histórica (Que Está Mudando!)

Historicamente, o Brasil sempre foi visto como menos vulnerável a grandes catástrofes naturais. Estamos no centro da placa tectônica sul-americana, o que nos poupa de terremotos intensos, vulcões e tsunamis, comuns em outros países. Nosso clima tropical também nos dava temperaturas mais estáveis e chuvas bem distribuídas. Mas, como vimos, as mudanças climáticas estão reescrevendo essa história, trazendo eventos cada vez mais severos e imprevisíveis.

2. O “Otimismo” Brasileiro e a Percepção de Risco

Dyogo Oliveira, presidente da Confederação Nacional das Seguradoras (CNSeg), aponta um fator cultural: o otimismo. “O brasileiro em geral é muito otimista. A gente sempre acha que nunca vai acontecer com a gente”, ele comenta. Em outras sociedades, talvez por terem enfrentado grandes tragédias, a atenção aos riscos é mais pragmática.

3. Preço e Desconhecimento

Jarbas Medeiros, diretor da Porto Seguro, líder no mercado de seguros “não-vida”, destaca a percepção de preço. As pessoas comparam com o seguro de carro, que é bem mais caro. Mas a verdade é que o seguro residencial, em relação ao valor do imóvel, é bem mais acessível. Enquanto um seguro de carro pode custar mais de R$ 2 mil por ano, o residencial fica na média de R$ 600 a R$ 800 anuais. Muitas vezes, na hora de escolher, o consumidor opta pela opção mais barata, abrindo mão de coberturas importantes.

4. Realidade Socioeconômica

Não podemos ignorar que grande parte da população brasileira tem baixa renda e muitos vivem em imóveis irregulares, sem título de propriedade. Isso, claro, dificulta muito a contratação de qualquer tipo de seguro.

O Mercado de Seguros Residenciais: Crescimento e Desafios

Apesar dos obstáculos, o interesse por seguros residenciais tem crescido. De 13,6% em 2017, a parcela de residências seguradas subiu para 17% em 2021, totalizando 12,7 milhões de lares, segundo a Federação Nacional de Seguros Gerais (Fenseg). A região Sul, que tem sofrido bastante com eventos extremos, lidera com 29,7% de casas seguradas, seguida pelo Sudeste (22,3%), Centro-Oeste (12,9%), Nordeste (7%) e Norte (4,6%). No Rio Grande do Sul, por exemplo, 38,6% das residências têm seguro, à frente de São Paulo (29%), Santa Catarina (27,1%), Paraná (22,7%), Distrito Federal (21,8%), Rio de Janeiro (17,9%) e Minas Gerais (14%).

No entanto, em 2021, apenas 10% das apólices de seguro residencial incluíam cobertura de desmoronamento, e a de alagamento representava menos de 1% do total.

Após grandes eventos climáticos, a conscientização aumenta. A Bradesco Seguros notou um aumento de 15% a 30% na contratação de seguros nos quatro meses seguintes a desastres. No Sul, a cobertura contra alagamentos cresceu 158% depois das inundações de abril de 2024, mas ainda atinge apenas 4% a 6% dos 1,5 milhão de imóveis segurados na região.

A Porto Seguro também registra um crescimento notável: a cobertura contra danos elétricos subiu 6% ao ano nos últimos cinco anos, e a contra vendaval (que inclui ventos fortes, furacões, ciclones, tornados e granizo) aumentou 4% ao ano no mesmo período. A cobertura contra alagamentos, oferecida pela Porto Seguro desde 2021, teve um crescimento médio anual de 108% em quatro anos.

O Dilema da Precificação e as Mudanças Climáticas

Para as seguradoras, o cenário atual é um desafio e tanto. A falta de dados históricos confiáveis sobre o impacto dos incidentes climáticos no Brasil dificulta a precificação. Dyogo Oliveira, da CNSeg, revela que a entidade está construindo uma base de dados e um hub de dados climáticos, com lançamento de um estudo previsto para a COP30, em novembro. A ideia é auxiliar as empresas a avaliar melhor esses riscos, que se tornaram imprevisíveis.

Jarbas Medeiros, da Porto Seguro, reforça que os desastres climáticos são “fenômenos relativamente novos do ponto de vista histórico e estatístico” no Brasil. A informação do passado já não serve para projetar o futuro, pois a frequência e a severidade dos eventos estão em constante aumento. “Nunca houve uma enchente como aquela do Rio Grande do Sul e não se sabe se a próxima grande enchente vai ser em Porto Alegre, ou em Florianópolis”, exemplifica Oliveira. Por isso, muitas seguradoras estão investindo em modelos preditivos para tentar contornar essa incerteza.

O Papel Essencial do Poder Público na Proteção Contra Desastres

Para realmente mudar o jogo, não basta apenas a conscientização individual. Especialistas e representantes do setor de seguros concordam que a participação do poder público é crucial, especialmente em um país com grande parte da população de baixa renda e em áreas de risco.

A CNSeg propõe a criação de um seguro social contra catástrofes. A ideia é simples: um custo estimado de R$ 3 seria adicionado à conta de luz (exceto para famílias de programas sociais), garantindo uma indenização imediata de R$ 10 mil via Pix para famílias afetadas por desastres, assim que o estado de calamidade for decretado. Os recursos poderiam ser usados livremente, conforme a necessidade.

Outra proposta interessante vem de um estudo da Fundação Getulio Vargas (FGV), publicado em maio deste ano pelos pesquisadores Bernard Salanié, Humberto Moreira e Sophie Mathes. Eles sugerem um modelo de seguros contra enchentes contratados pelos municípios junto ao setor privado. Esses contratos seriam financiados por impostos locais e financiamento climático, e os seguros seriam paramétricos — ou seja, pagariam automaticamente ao atingir parâmetros climáticos predefinidos, sem a necessidade de comprovar o prejuízo. Os pesquisadores da FGV argumentam que o seguro domiciliar, mesmo que obrigatório, não é viável no Brasil, dada a realidade socioeconômica e a dificuldade das pessoas em tomar decisões sobre riscos.

Fonte: Terra